17 de fev. de 2010

Para uma avenca partindo


Minha experiência com os contos do Caio Fernando Abreu começou de forma estranha. Enquanto a maioria das minhas amigas da época o adoravam, o liam e o recomendavam, eu só havia tido experiências ruins com o Caio. Li alguns de seus contos e não gostei de nenhum por causa de seu realismo e de sua melancolia.

Em certa Feira do Livro, resolvi dar um passo maior, pois eu sempre gostei de dar uma segunda chance para tudo e para todos, então me arrisquei comprando um de seus livros: “O Ovo Apunhalado”. Continuei não gostando de muitos de seus contos e, no entanto, acabei me apaixonando por todos os outros.

Um conto que leio e releio deste livro é aquele que intitula a postagem e, inclusive, o nome deste blog provém do desfecho do referido conto. “Para uma avenca partindo”, no meu ponto de vista, é um conto sobre o essencial que não é dito e o que o rodeia e esconde: o desnecessário.

Aqui, deixo uma palhinha:

“(...)acho que foi o fato de você partir que me fez descobrir tantas coisas, espera um pouco, eu vou te dizer de todas as coisas, é por isso que estou falando, fecha a revista, por favor, olha, se você não prestar muita atenção você não vai conseguir entender nada, sei, sei, eu também gosto muito do Peter Fonda, mas isso agora não tem nenhuma importância, é fundamental que você escute todas as palavras, todas, e não fique tentando descobrir sentidos ocultos por trás do que estou dizendo, sim, eu reconheço que muitas vezes falei por metáforas, e que é chatíssimo falar por metáforas, pelo menos para quem ouve, e depois, você sabe, eu sempre tive essa preocupação idiota de dizer apenas coisas que não ferissem, está bem, eu espero aqui do lado da janela, é melhor mesmo você subir, continuamos conversando enquanto o ônibus não sai, espera, as maçãs ficam comigo, é muito importante, vou dizer tudo numa só frase, você vai ……… ………… …………. ………… ………. ……….. …………. ………… ………… ………… ……… ……….. ………… ………… sim, eu sei, eu vou escrever, não eu não vou escrever, mas é bom você botar um casaco, está esfriando tanto, depois, na estrada, olha, antes do ônibus partir eu quero te dizer uma porção de coisas, será que vai dar tempo? Escuta, não fecha a janela, está tudo definido aqui dentro, é só uma coisa, espera um pouco mais, depois você arruma as malas e as botas, fica tranqüila, esse velho não vai incomodar você, olha, eu ainda não disse tudo, e a culpa é única e exclusivamente sua, por que você fica sempre me interrompendo e me fazendo suspeitar que você não passa mesmo duma simples avenca? Eu preciso de muito silêncio e de muita concentração para dizer todas as coisas que eu tinha pra te dizer, olha, antes de você ir embora eu quero te dizer quê.”

Um comentário:

  1. Não posso falar muito sobre o Caio, mas alguns contos são legais, outros nem tanto.

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